São muitos os motivos que me levam de volta ao Dona Onça. Antes de tudo, o lugar em si. Instalado no térreo do icônico edifício Copan, o bar da chef Janaína Rueda é um manifesto de celebração do centro de São Paulo. No salão, certa elegância de bar antigo se mistura à tremenda irreverência que é marca registrada de sua dona, o que se traduz num ambiente único. Ainda que fosse só pelo lugar, eu voltaria sempre. Mesmo que a ementa fosse desinteressante ou que a comida fosse má. Felizmente, não é o caso.
O jeito de comer à brasileira é fio condutor de um cardápio de fôlego, que vai dos excelentes petiscos aos arrozes, dos PFs às sopas, passando por uma seleção de massas e culminando num extenso rol de pratos de carne, onde há desde frango com quiabo até dobradinha. Me pergunto se a cozinha transita por todos esses caminhos com igual desenvoltura. Não estive lá tantas vezes a ponto de ter a resposta. O fato é que, nas visitas que fiz ao longo dos últimos anos, jamais testemunhei deslizes – talvez alguma inconsistência nas sobremesas, que me parecem um tom abaixo da cozinha salgada. Há pouco mais de um mês, durante uma semana a trabalho no centro da cidade, a fome me levou ao bar duas vezes. Fui feliz em ambas.
Gosto particularmente dos petiscos e pratos que homenageiam a comida mais caseira. Coisas que não encontramos tão facilmente em restaurantes, como couve-flor à milanesa e bolinhos de espinafre – é preciso falar dos bolinhos de espinafre do Dona Onça, extremamente delicados e saborosos. Um tipo de comida muito presente na mesa da minha mãe e que, portanto, é sempre um conforto reencontrar.
Os croquetes de carne de panela, muito gostosos, são também merecedores de todas as loas.
O prazer particular que me trouxeram os bolinhos de espinafre repetiu-se com o arroz de fígado acebolado. Ali, a lembrança foi ainda mais longe e me levou às iscas de fígado da infância na casa da avó. Na versão de Janaína, elas chegam cheias de sabor, num molho intenso que umedece o arroz. As cebolas ora surgem crocantes, ora caramelizadas. Um belo ovo frito deixa o prato ainda melhor.
Filhos de outras mães, netos de outras avós talvez não vislumbrem naquele repertório tantos significados, mas apenas a oportunidade de uma ótima refeição. Pra mim, é mais que isso. É a possibilidade de encontrar na comida a tão fundamental conexão com a memória.
Bar da Dona Onça – Avenida Ipiranga, 200 - Edifício Copan, lojas 27 e 29 – Centro –São Paulo.