Aproveitei a temporada em Londres em outubro passado pra conhecer o novo restaurante de Heston Blumenthal, abrigado no Mandarin Oriental. Quem for ao Dinner esperando encontrar o mesmo Blumenthal do The Fat Duck tem grandes chances de se decepcionar. Sobre as mesas do salão voltado pro Hyde Park, nada remete à cozinha tecnoemocional do icônico restaurante em Bray. Fui com isso em mente e, portanto, não passei pelo dissabor de expectativas frustradas. Ao contrário, vi por trás do que se come no Dinner a construção de um trabalho admirável.
Não vou me estender repetindo o que já se leu em todo canto. Heston e Ashley Palmer Watts (que está a seu lado há anos e é quem efetivamente comanda a cozinha do Dinner), ao mergulharem nas referências históricas da cozinha de seu país (com a valiosa ajuda de historiadores), não se contentariam com despretensiosas releituras de pratos antigos. Se no belo salão envidraçado as evidências desse mergulho não vão muito além das formas de bolo que fazem as vezes de luminárias, no cardápio, que muda de tempos em tempos, percebe-se a profundidade do mergulho. A partir de uma pesquisa meticulosa, a dupla moderniza e traz pros dias de hoje receitas que podem ter suas raízes no século XIV ou XVIII. Cada prato é posicionado na linha do tempo e, no final do cardápio, apontam-se as fontes bibliográficas a que se recorreu. O que me permitiu saber, por exemplo, que a meat fruit que estampou exaustivamente todos os artigos publicados sobre o restaurante nos meses seguintes à sua inauguração, além de ser um patê absurdamente bom – acompanhado de torradas perfeitas – , é um prato cujas origens estão entre os séculos XIII a XV...
Ou, ainda, que a costeleta de porco colossal que aterrissa em minha mesa, depois de passar por cocção a vácuo e ser finalizada em forno a lenha, chega acompanhada de um belíssimo molho cuja referência vem do período em que Carême viveu em Londres. Um adendo: pra mim, tão importante quanto o tal molho naquele prato era o risotto de farro que vinha acomodado sob uma indulgente camada de lardo, salpicado com cogumelos e torresminhos.
Ou, finalmente, saber que, embora seja uma sobremesa meio boba – ainda que gostosa –, o lemon pudding inspirou-se numa receita que tem quase quatro séculos de história.
Quer saber? Adoraria ver um projeto como esse tomando forma a partir dos anais da cozinha brasileira...
Dinner by Heston Blumenthal – Mandarin Oriental Hyde Park – 66 Knightsbridge - London
http:/www.dinnerbyheston.com/
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