Acompanhei a gestação do Belo Comidaria através de imagens publicadas por seu chef, Henrique Gilberto, e um de seus sócios, Rafael Mantesso (autor do site Marketing na Cozinha) no Instagram. O que me permitiu supor, antes mesmo de sua inauguração, que se tratava de um projeto muito bem pensado e não só mais um restaurante entre tantos. Tive certeza disso no início deste mês, ao visitá-lo pela primeira vez.
Do conceito do negócio à atmosfera criada pela decoração, da concepção do cardápio à atitude que se evidencia em certas escolhas – como a de revelar, na parede de entrada da casa, a procedência dos produtos com que trabalham –, percebe-se inteligência, bom gosto e vontade de ser mais do que apenas um número num mar de estatísticas.
O lugar se desdobra em duas facetas: de um lado, padaria/confeitaria; de outro, restaurante. Estive ali duas vezes num mesmo fim de semana. A primeira no jantar, a segunda no café da manhã do dia seguinte. Arrisco dizer que a metade padaria/confeitaria talvez já esteja mais redonda que a metade restaurante. Comi bem e gostei do que vi, mas algumas coisas me pareceram melhores no cardápio do que no prato. Saí com a impressão de que a cozinha ainda precisa de tempo para amadurecer, ganhar consistência, aparar arestas. Nada mais natural, afinal, falo de um restaurante que ainda não tem seis meses de vida.
O enxutíssimo e bem resolvido cardápio revela uma cozinha que tem evidente senso de pertencimento à região em que se encontra, o que fica claro nas receitas exploradas e na escolha de ingredientes, sempre abordados segundo um olhar atual. Deu vontade de provar muitas coisas, mais do que os limites físicos nos permitiriam. Especialmente, na seção de petiscos que celebra a carne de porco – das quatro opções, experimentamos duas.
Começamos o jantar com palmito pupunha grelhado, com picles de cebola, berinjela, cogumelos e alho assado. Era evidente a atenção ao ponto de cada elemento. Juntos, pareciam ainda melhores. Provavelmente, o melhor prato da noite.
Em seguida, pimentas cambuci recheadas com carne de porco, que me lembraram imediatamente as que comi tempos atrás no Dalva e Dito, em São Paulo. Tão boas quanto as do restaurante paulistano, ganham, ainda, a companhia de um saboroso molho de feijoada.
No prato que trazia carne de pescoço de peru desfiada com jiló e cogumelos tostados, achei tímida a participação do jiló. Poderia estar mais presente, não apenas por questão de equilíbrio na proporção do prato, mas, especialmente, porque as lâminas de jiló e os cogumelos estavam mais gostosos que a própria carne...
À costelinha de porco faltava sal, mas o ponto era impecável: sob a crosta crocante, a carne entregava-se ao garfo. O purê de cará que a acompanhava era correto apenas.
Quanto à sobremesa, nossa escolha havia sido o Mineiro de Botas, mas o simpático garçom fez tanta propaganda do já famoso bolo de chocolate da casa que nos levou a ponderar. O golpe de misericórdia veio quando o rapaz trouxe o bolo à mesa. Depois de vê-lo, não havia como não sucumbir. Acabamos perdendo o bom senso e ficando com os dois.
A versão do Mineiro de Botas trazia bolinho quente de doce de leite, bom sorvete de banana, queijo grelhado e um bocado mais de doce de leite – que me pareceu próximo de um caramelo, sutil, sem exagero no açúcar. O queijo, com crosta dura demais, resistente ao garfo, ficou sem liga com o restante do conjunto.
Quanto aos oito andares do bolo de chocolate com caramelo, devo dizer que o impacto visual foi maior que o prazer que ele proporcionou. É gostoso. Mas, por ser servido gelado, o recheio se torna um bloco compacto que se desconecta da massa, que também sofre com a refrigeração. Levamos metade do pedaço pra viagem e guardamos pra experimentar depois, menos gelado. Aconteceu o que previ: achei melhor.
Não, o post ainda não acabou. Tomem fôlego pro segundo ato.
Como havia dito, voltei para o café da manhã no dia seguinte. Na vitrine, belos pães (o brioche, que não cheguei a provar, estava especialmente bonito), bolos e biscoitos. Novamente, vontade de experimentar mais do que seria fisicamente possível.
O único tropeço no percurso foi a cesta de pães. Não estavam quentes e a manteiga que os acompanhava veio gelada. Acabamos deixando de lado e pedimos pães de queijo. Gostosos, embora a massa, pro meu gosto, fosse um pouco pesada.
A estrela da refeição foi o delicioso sanduíche de linguiça com tomate assado e requeijão. Ótimo pão de milho, linguiça ainda melhor. Dessas coisas que dão a medida de como é bom estar em Minas Gerais...
Pra encerrar, bolo de rapadura com recheio de café. Foi difícil preterir o de canela com nozes e o de fubá com goiabada, mas não me arrependi da escolha. Uma delícia.
Trouxe comigo alguns dos tais pães de milho, além de uns pares de ótimos biscoitos amanteigados com recheio de goiabada. E a vontade de ter um balcão como aquele perto da minha casa...
Belo Comidaria – Rua Orange 67 – Bairro São Pedro
http://www.belocomidaria.com.br/